“Quem, eu? Eu não sinto vergonha. Já passei por cima disso tudo. Mas a vergonha é insidiosa. Não se apresenta em luzes néon. Na sua vida diária, não se manifestará como vergonha. A sensação que dará – e aposto que isto é algo que você tem sentido numa base regular – é de desmerecimento.
Isso mesmo. Desmerecimento.
Agora já lhe captei a atenção?
Um amigo ou um colega faz-lhe um elogio. A sua irmã diz algo amável a seu respeito. O seu namorado compra-lhe flores. E… você não consegue receber. Não aceita. A sua própria linguagem corporal é recuar. Baixar a cabeça, gesticular com as mãos – rechaçando o elogio. Não, não, balbucia. Talvez core. Fica um bocadinho entorpecido emocionalmente. Sente-se embaraçado.
Isto é vergonha em acção.
A vergonha é a corrente subterrânea que o mantém a viver na crença de que é desmerecedor de toda a magnanimidade que a vida tem para oferecer.
Algures pelo caminho, interiorizámos a crença de que somos – no mais profundo dos nossos seres – imperfeitos e errados. A vergonha não é uma emoção humana natural. Os bebés não nascem a sentir vergonha. Fabricamo-la dentro de nós, como castigo por não aderirmos às normas da sociedade. Mas aqui está uma ideia provocadora. Se sentimos vergonha dos nossos pensamentos e actos privados – não conhecemos, não podemos conhecer, os pensamentos privados das outras pessoas, de modo que comparamos os nossos interiores aos exteriores alheios -, não nos permitimos o conhecimento transformador de que estamos tão longe de estar sós. As nossas mais íntimas expressões, pensamentos e comportamentos são a verdadeira norma. Só que não falamos disso. A vergonha mantém cada um de nós no seu próprio armário escuro – escondido da luz do dia.
Na nossa experiência do dia a dia, a chave para reconhecermos a energia da vergonha é darmos por nós quando nos estivermos a retrair.
À medida que for avançando por este dia fora – este dia precioso e único -, tome consciência de cada vez que se retrair. De cada vez que se defender. Pode manifestar-se como escrúpulos. Desconforto. Embaraço. Um desejo de fugir. Poderá até rir-se constrangido. Está a ver esse sorriso ou risinho nervoso? É retraimento, bem patente. Repare quão mais fácil é, no decurso do seu dia a dia, receber censura e crítica do que amabilidade e louvor.
Quando der consigo a retrair-se, pare. Respire direito ao coração. Abra as palmas das mãos. Só este simples gesto permitir-lhe-á começar a receber o amor, o apoio, a ajuda, o louvor, o pequeno acto de amabilidade. Alguém lhe oferece um lugar no comboio. Ou simplesmente sorri-lhe quando passa. Sentimo-nos tão constrangidos quando alguém sorri para nós, não sentimos? O nosso palavreado interior, se pudéssemos realmente ouvi-lo, seria este: Oh, Deus, não podes estar a sorrir para mim. Se soubesses o que eu escondo cá dentro, não sorririas para mim…
A nossa vergonha considera-nos indignos de amor.
Impede-nos de pedir ajuda.
Mantém-nos emperrados e a girar na mesma velha história.
Só por hoje, passe à receptividade. O seu retraimento é o seu mapa de estradas. Tire-se do vórtice invisível de vergonha que se tornou a sua configuração por defeito.
Só por hoje, veja que tal sabe abrir esse punhos cerrados – esse coração cerrado – e receber toda e cada coisa boa.” – Panache Desai