“Ainda que pareça perfeitamente claro que nenhum de nós merece o começo particular que recebemos na vida, haverá sempre certas pessoas presumidas que imaginam que têm, de algum modo, direito à sua boa sorte. Algumas vezes, estas pessoas invocam a divindade para justificar a sua alta posição, como se a providência não tivesse nada mais importante a fazer que conservá-las acarinhadas e protegidas. Algumas vezes, apontam para a hereditariedade, como se um recado antepassado, que ganhou uma outorga de terra ou fundou uma companhia, tivesse alguma influência directa no seu próprio merecimento. Algumas vezes, estas pessoas presumidas parecem mesmo não ter dispensado qualquer reflexão aos caprichos da sorte que as favoreceu; a roda da sorte avançou no seu caminho, então por que questionar o processo?
Todos nós, provavelmente, encontrámos pessoas como estas, num momento ou noutro. Podem ser as arrogantes (e algumas vezes batoteiras) na escola, as muito delicadas mas incapazes, as simuladoras de estar doentes no trabalho, as pessoas que pensam que podem substituir trabalho árduo por esperteza política. Tendem a ser crianças no campo de golfe; em ténis muitas vezes apresentam boa forma e pobre desportivismo. Em termos de amizade são algumas vezes muito divertidas e totalmente não confiáveis.
Em resumo, são pessoas que foram estragadas por vantagens com que nasceram, mas não mereceram.
Se nós não as observarmos suficientemente de perto, é fácil invejar estas pessoas, isto se nós próprios valorizarmos as coisas que parecem defini-las. Elas tendem a ter maneiras polidas e belos carros. Têm passatempos elegantes, como vela e equitação. Mesmo quando não parecem especialmente brilhantes ou intelectualmente vibrantes, tendem a ter credenciais oriundas de todas as escolas de referência, assim como uma lista extensa de contactos, que podem facilitar a sua entrada nos negócios e na profissão. Enquanto a maioria das pessoas tem que trabalhar arduamente o seu caminho através da vida, estas pessoas parecem deslizar. Seguras das suas prerrogativas, despreocupadas na sua abordagem às situações, parecem vogar em ritmo de cruzeiro e alcançar o que pretendem.
Invejável, certo? Talvez nem tanto, se olharmos um pouco mais fundo.
Por baixo da pele bem tratada e de maneiras polidas de muitas destas pessoas privilegiadas, alguma coisa parece faltar. A confiança aparente resulta ser ténue e frágil, nada de verdadeira segurança, mas simplesmente o hábito de parecer estar no topo das coisas. O gozo algo maníaco por certos brinquedos (carros, barcos, casas de verão) resulta ser imperfeita compensação para coisas que são mais preciosas, subtis, difíceis de compreender: um sentido de objectivo, um conhecimento e aceitação de quem elas realmente são, uma conexão muito significativa entre as coisas que possuem e as coisas por que aspiram nos seus corações.