“Quando andamos a correr em círculos atrás dos nossos anseios e do falso poder, está a passar-nos despercebido algo que é crucial para a nossa felicidade: a experiência do amor. Com o insight da impermanência, do não-eu, do inter-ser, temos a oportunidade de experimentar o amor verdadeiro. O escritor francês Antoine de Saint-Exupéry afirmou que amar outra pessoa não significa sentarmo-nos a olhar um para o outro; significa olharmos ambos na mesma direcção. Todos nós devemos observar profundamente a nossa vida para verificarmos se na nossa experiência isto é ou não verdade, e se for, até que ponto o é. Cada um de nós tem necessidades e desejos, por isso quando amamos alguém, temos tendência para olhar para essa pessoa. Esperamos ver nela a bondade, a verdade e a beleza que procuramos. Estamos sedentos de sinceridade. Buscamos algo de sagrado, de belo, de bom, algo que seja benéfico. Muitos de nós acreditam que assim que encontrarmos estas qualidades noutra pessoa, sentiremos que nada nos falta, e estaremos menos sós.
Todos começamos por procurar a beleza, a verdade e a bondade nos outros. Muitos de nós acreditam que são poucas as pessoas que têm estas qualidades.
Quando as encontramos em alguém, podemos apaixonar-nos, porque acreditamos ter encontrado a essência da verdade, da beleza e da bondade. Devemos ser cuidadosos nesta busca, pois podemos ter percepções erradas. Por vezes a beleza que achamos ser real não é a verdadeira beleza. A verdade que pensamos ser real não o é. E a benevolência que percepcionamos não é verdadeira bondade. Portanto, podemos amar alguém baseados numa percepção errada. Quando ficamos realmente a conhecer essa pessoa ao longo de algum tempo, descobrimos que falhámos, porque essa pessoa não é capaz de simbolizar para nós a beleza, a bondade e a verdade que procuramos. Dizemos que a pessoa nos desiludiu, e sofremos. Então partimos em busca de outra pessoa que possamos amar. Podemos falhar muitas vezes, caindo na mesma situação, cansando-nos ou desiludindo-nos com a outra pessoa. Se continuarmos assim, podemos passar a nossa vida numa busca constante de alguém.
Andamos todos a enganar-nos uns aos outros. Lá bem no fundo, sentimos que não existe nada bom, belo e verdadeiro em nós, e ao mesmo tempo estamos desesperados por mostrar aos outros o quanto somos bons, belos e verdadeiros. E assim nos vamos enganando de geração em geração. E enquanto estamos a enganar os outros, estamos igualmente a ser enganados por eles. Somos vítimas uns dos outros. Estamos a tentar parecer melhores de forma a parecermos menos feios, e os outros estão a fazer o mesmo.
Quando reconhecermos que existe em nós a essência da bondade, da beleza e da verdade iremos parar de andar à procura de algo. Vamos parar de vaguear por aí sentindo que nos falta alguma coisa. E seremos capazes de deixar de enganar os outros. Não teremos de nos adornar porque descobrimos a verdade, a beleza e a bondade aqui dentro de nós.
Todas as pessoas que vivem neste mundo – mulheres, homens, ricos, pobres, instruídos, analfabetos, doentes, saudáveis – todos têm esta base de bondade, beleza e verdade. Não devemos continuar a procurar fora de nós mesmos, porque aquilo que procuramos já se encontra dentro de nós. E todos nós temos de regressar a nós próprios para podermos entrar verdadeiramente em contacto com a beleza, a bondade e a verdade que estão dentro de nós. Uma vez que tenhamos estado em contacto com esta natureza interior, teremos posto fim às muitas vidas de procura e teremos uma fé inabalável em nós mesmos. Então seremos felizes; teremos paz.
Temos ideias sobre o que é a beleza, sobre o que valemos, e estas ideias podem constituir obstáculos à nossa felicidade. Imaginamos coisas, construímos coisas na nossa cabeça e sofremos com elas. Receamos que os outros nos estejam a julgar, e é este medo, mais do que o verdadeiro julgamento, que nos deixa perturbados. O sofrimento é inteiramente criado na nossa mente.
Em certas ocasiões, a falta de compreensão entre nós e outra pessoa é algo que realmente acontece. Podemos ser mal compreendidos por muitas pessoas, e ainda assim não temos de sofrer com isso. Basta que vivamos a nossa vida com correcção e, passado algum tempo, os outros irão corrigir a percepção errónea que tiveram a nosso respeito. Nós sabemos o que se está a passar cá dentro. Sabemos como é a nossa mente. Se todos os dias tivermos um pensamento positivo, boas ideias, com compreensão e compaixão, se todos os dias praticarmos um discurso amável; se todos os dias executarmos boas acções, nós próprios sabemo-lo. O nosso valor revelar-se-á a si próprio àqueles que nos rodeiam. Pode levar alguns dias ou várias semanas, pode até levar anos. Mas se soubermos quem somos, não temos de sofrer mais. A prática de nos compreendermos a nós mesmos e de nos exercitarmos a produzirmos cada vez mais pensamentos, palavras e acções repletos de beleza dá-nos autoconfiança, e isso irá transformar tudo o resto.
Buda falou em quatro elementos que constituem o verdadeiro amor: a capacidade de ser amável e de proporcionar felicidade, maitri em sânscrito; a compaixão, a capacidade de aliviar o sofrimento, karuna; a capacidade de trazer felicidade todos os dias, mudita; e, finalmente, a capacidade de não discriminar. Upeksha. Quando há amor verdadeiro, não há discriminação. A dor do outro é a nossa própria dor; a felicidade do outro é a nossa própria felicidade. À luz da não-discriminação a felicidade e a dor são colectivas e não individuais. Se não compreendermos o nosso companheiro, se não partilharmos o seu sofrimento, então não o amamos; estamos simplesmente a consumir a outra pessoa para a satisfação das nossas próprias necessidades individuais. O amor verdadeiro caracteriza-se pela atenção, pelo respeito. Se tivermos esta atenção, então quando virmos o sofrimento do outro, não podemos continuar a causar-lhe dor. Se o respeitarmos não podemos continuar a fazê-lo.