Tolerância

“Temos uma tolerância mínima relativamente a determinadas emoções, como a impotência e o medo. É-nos difícil lidar com a dor crua da ameaça e da perda, porque não estamos, pura e simplesmente, preparados para lidar com ela. Ou para darmos conta do recado. É por isso que tentamos perceber, resolver e alterar as coisas. Ou, em alternativa, reter tudo dentro de nós.

A noção moderna de que nos podemos tornar senhores e donos do nosso destino – orientando a mente num rumo para o «êxito», através de técnicas como a visualização e as afirmações positivas – tem sido, no mínimo, muito inspiradora. Abundam histórias de empreendedores autodidactas. Mas a ideia de que podemos controlar tudo assim deu aso a uma tendência perturbadora – a de tentar esmagar as emoções «negativas». Acima de tudo, detestamos sentir-nos impotentes. Os nossos filhos crescem a ouvir-nos mandá-los ficar sossegados, sentados à secretária, de braços cruzados. Não lhes damos escapes construtivos para a raiva e a revolta, a confusão, a curiosidade e a mágoa.

Pelo contrário, quando determinadas emoções surgem no ecrã do radar, optamos por matar o mensageiro. Crucificamos esses sentimentos de mágoa ou fúria. Simplesmente não os permitimos. Afastamo-los, nas nossas tentativas de seguir em frente. Mas as emoções não passam de sinais de radar. Mesmo que os seus sentimentos o perturbem ou incomodem, dê graças por ter emoções – só provam que está vivo!

Em vez de matarmos o mensageiro, temos de ouvir a mensagem e tentar perceber o que é que estamos a tentar mostrar ou dizer a nós próprios. A mágoa pode servir para me demonstrar o quanto realmente gostava de outra pessoa. A confusão, para me dar a ver que tenho tido uma compreensão desadequada do mundo. E, agora, esses sentimentos estão a abrir-me a uma compreensão mais profunda e superior – e, muitas vezes, a fazer-me agir. Na verdade, ser capaz de sentir é uma coisa maravilhosamente tranquilizadora e revigorante.

Algures, pelo caminho, adquirimos a noção de que os sentimentos são nocivos. Pense na publicidade negativa que já recebeu. Ninguém quer ser descrito como «mole» ou «piegas», porque se presume que as pieguices são desnecessárias e demonstram indulgência, excesso e fraqueza. Fazem-nos parecer vulneráveis e inaptos. Então, tentámos arranjar formas de ultrapassar e contornar as coisas – para provarmos a nós próprios que somos racionais e temos tudo sob controlo. No rescaldo do iluminismo, o intelecto passou a ser valorizado acima de tudo, incluindo as nossas emoções mais humanas.

Actualmente tão popular, a psicologia «positiva» transmite às pessoas a sensação de que podem ultrapassar ou contornar todos os sentimentos ou experiências negativas, gerando pensamentos positivos. Em bom rigor, o que fazem é reprimir sentimentos muito reais. E que, das duas, uma: ou voltam mais fortes do que nunca, ou se tornam segredos repisados, incorporados e escondidos nas nossas profundezas e que carregamos com vergonha.

Sabemos muito pouco acerca do que é o nosso universo, para onde vai tudo, ou de onde veio tudo. Tal como sabemos muito pouco sobre como podemos preencher a ausência de um colega de escola ou de trabalho ou da inocência perdida. Aliás, não só não podemos entendê-la ou resolvê-la, como também nem devemos tentar. Quanto mais tentarmos encontrar sentido naquilo que não faz nenhum sentido, mais nos afastamos de nós próprios, mais nos tornamos desincorporados, desassociados, dessensibilizados.” – Ken Druck

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